quinta-feira, 30 de julho de 2009

Foi há pouco, este fim de tarde, no Vitória

Declaração Política

de Ruben de Carvalho

Este nosso encontro – no qual, em meu nome e da Coligação Democrática Unitária, agradeço a vossa presença – revelou-se-nos imperioso por duas ordens de razões: por um lado, por diversos acontecimentos que têm caracterizado as últimas semanas (e em particular os últimos dias) relativamente à campanha eleitoral para a Câmara Municipal de Lisboa. O facto de, em rigor, ela ainda nem sequer ter começado torna-os, em nosso entender, ainda mais significativos, preocupantes e graves do que poderá vir a acontecer nos escassos dois meses que nos separam das eleições com manifesto prejuízo do que se pretende seja um esclarecimento sério e completo do eleitorado sobre o que está em jogo e quais as alternativas para a situação da capital.

Em segundo lugar, verificaram-se na reunião pública da Câmara ontem realizada desenvolvimentos da questão Parque Mayer-Bragaparques que serão já parcialmente do vosso conhecimento – a reunião foi, como disse pública, embora o relevante para o caso tenha ocupado já praticamente o seu final, passavam as 21 horas – mas sobre os quais pensamos indispensável apresentar-vos a posição da CDU.

1. O esforço para a bipolarização entre o PS e o PSD de qualquer dos actos eleitorais a realizar em breve – legislativas e autárquicas – é uma evidência que dispensa qualquer demonstração. Recorrendo a todos os meios – e os profissionais aqui presentes não negarão seguramente a nossa constatação que há aqui também uma contribuição da política editorial da maioria da Comunicação Social – apresentam-se as opções eleitorais em que o povo português é chamado a decidir sobre os seus destinos próximos como se em jogo estivessem apenas políticas que reconhecidamente em tudo se aproximam mas são protagonizadas por dois únicos partidos: o PS e o PPD/PSD.

Temos combatido esta tendência, que não é nova, infelizmente, por todos os meios e sublinhado o seu carácter visceralmente antidemocrático e, muito em particular, contrário ao espírito e à forma da ordem constitucional do Portugal de Abril. A nossa Constituição não criou um espaço político dicotómico, de alternâncias clientelares, mas pelo contrário um espaço plural, amplo, livre e aberto à diversidade de opiniões e propostas políticas, cimentado na convicção de que as melhores soluções para um povo são aquelas onde mais amplas foram as suas condições de opção e para as quais mais vastos forem os contributos e vontades.

2. O que sucedeu com a sucessão de entrevistas realizadas na RTP 1 com os candidatos do PS e do PSD à Câmara de Lisboa e o debate com os mesmos protagonistas efectuado já esta semana na SIC é um estrondoso exemplo desta situação, parecendo-nos importante sublinhar dois aspectos: primeiro, relativamente à RTP, a clara violação dos princípios do Serviço Público e das suas imposições de independência, isenção e pluralismo; segundo, a forma como a SIC, embora sendo canal privado, de todo ignorou o manifestamente justo protesto formulado pela CDU junto da ERC e da própria RTP. Não sendo juridicamente uma situação semelhante é talvez do ponto de vista de ética política e profissional pelo menos igualmente negativo.

3. Naturalmente, estes dois episódios televisivos tiveram reflexos na imprensa escrita que ampliaram esta tendência bipolarizadora que referimos. Hoje e aqui queremos renovar o nosso veemente protesto contra o que sucedeu, o nosso veemente apelo à Comunicação Social para uma cobertura isenta, plural e democrática e reafirmar a nossa absoluta resolução de contrariarmos por todos os meios políticos e legais novas expressões desta negativa tendência.

4. E queremos igualmente sublinhar que entendemos que do respeito – ou desrespeito – por este mandato democrático que é o do pluralismo da campanha eleitoral não estão isentos os próprios candidatos. Não é aceitável que, com as suas presenças feitas sob a desculpa de serem simples objectos de convites, nomeadamente os candidatos do PS e do PSD virem a dar objectiva cobertura e colaboração a uma prática que contraria o que de mais profundo e enriquecedor existe no debate democrático e na sua expressão eleitoral: o seu pluralismo, a sua ampla participação, o frontal debate de ideias e propostas.

Fica dito, nomeadamente ao cuidado dos drs. António Costa e Pedro Santana Lopes.

5. Por outro lado e o mais brevemente possível, gostaria de recordar que há pouco mais de um mês, numa sessão de apresentação dos candidatos CDU às freguesias de Lisboa no terraço deste Centro de Trabalho, tive ocasião de fazer duas advertências:

«Tudo indica – disse nessa altura - que serão dois os eixos da campanha (de Lisboa do PS): uma, a decantada questão da situação financeira da Câmara e a alegada «normalização» (dizem eles) que terão conseguido; em segundo lugar, pretenderão transformar a discussão da revisão do Plano Director Municipal na sua própria campanha.»

Disse então que se «trata de dois artifícios que comportam perigos e requerem preparação da nossa parte.

«Quanto ao primeiro, a dramatização que foi feita da situação económica do Município facilitou o trabalho a António Costa, mais ainda o vendaval de ilegalidades e negociatas sobre os quais, recorde-se, o PS guardou o maior silêncio (quando não foi mesmo cúmplice).

«Mas a pura verdade é que a gestão PS nada resolveu de essencial mesmo neste caso. Como o próprio vereador das Finanças uma vez desabafou em plena reunião de Câmara, limitaram-se a empurrar os problemas com a barriga…

«Trata-se de um tema árido, mas sobre o qual teremos de encontrar formas de tornar claras as trapalhadas, incompetências e bloqueios a que estes dois anos não só não deram solução, como, em muitos casos, prolongaram e agravaram. As questões relacionadas com as freguesias e a descentralização, uma cuidada coordenação da nossa campanha ao nível municipal e de freguesia pode fornecer elementos preciosos.

«Quanto ao PDM, a operação tem duas vertentes que interessará considerar: por um lado, como é evidente (e já está suceder, de resto) trata-se de pura e simplesmente colocar de forma enviesada os serviços e os meios da Câmara ao serviço da propaganda eleitoral do Partido Socialista; em segundo lugar, a própria complexidade dos problemas, abre a porta à possibilidade de um vendaval de demagogias, promessas, perspectivas ilusórias e cobertura de medidas gravosas que deverá merecer a nossa atenção.»

6. Julgo que concordarão que, infelizmente, trinta dias depois tudo se encarregou de demonstrar que estas preocupações tinham razão de ser. Do confuso (e inexacto…) vendaval de números de há dois dias na SIC à reunião camarária de ontem e aos seus absurdos 90 pontos de ordem de trabalhos para permitirem exposições e power points sobre projectos preliminares, projectos de projectos, projectos de ideias para projectos, cartas desportivas aprovadas a dois meses do fim de mandato passando por um vendaval de subsídios de toda índole, passando até por um PSD (cujos dois primeiros eleitos, de resto, estiveram mais uma vez ausentes como estiveram a mais de 85 por cento das reuniões da Câmara para que foram eleitos) a absterem-se numa proposta relativa aos comerciantes do Bairro da Liberdade cujos termos de agendamento tinham solicitado! – assistiu-se a tudo.

É uma concepção de governo autárquico e de prática política que, consabidamente, não partilhamos. E estamos certos que ambas são um excelente elemento informativo para o eleitorado sobre aquilo que pode contar da parte do PS e do PSD-CDS.

7. Finalmente, a questão Parque Mayer-Bragaparques, tornada ainda mais actual pela decisão judicial de hoje quanto ao problema.

Conforme saberão os que acompanham mais de perto os trabalhos da CML, foi ontem posta à decisão uma alteração orçamental que visava o desbloquear de verbas para pagar indemnizações a alguns comerciantes ainda em funcionamento do Parque Mayer.

Os Vereadores do PCP manifestaram a sua frontal discordância relativamente àquele pagamento por desde sempre ter sido seu entendimento (baseado nos documentos de escritura da permuta entre a CML e a Bragaparques e em todas as informações prestadas pelos responsáveis executivos municipais até agora, que, embora ferida de todas as ilegalidades que mereceram o recurso aos tribunais para resolução do caso, a permuta fora feita na base (que sempre contestámos) da entrega pela CML à Bragaparques dos terrenos de Entrecampos da antiga Feira Popular completamente desocupados e livres de qualquer ónus, o mesmo rigorosamente se passando com o Parque Mayer relativamente à Bragaparques e à CML.

A nosso ver, era assim incompreensível e inadmissível que a CML, depois de ter gasto mais de 25 milhões de euros em discutíveis indemnizações aos feirantes da antiga Feira Popular e de ter assumido compromissos praticamente eternos com a Fundação da Colónia Balnear de «O Século», tivesse de suportar indemnizações do Parque Mayer que claramente cabiam à Bragaparques.

8. Para nossa perplexidade, o presidente António Costa informou que esta obrigação decorreria dos próprios termos da escritura celebrada na permuta e de que dispunha e de um parecer jurídico que solicitara aos respectivos serviços municipais que confirmavam a obrigatoriedade por parte da Câmara em função de esta ter assumido o estatuto de senhorio e os comerciantes o de seus inquilinos após a permuta.

Solicitámos de imediato cópia de todos estes documentos e votámos contra a Alteração Orçamental.

9. Os referidos documentos foram-nos enviados hoje – o que, refira-se, sublinhamos favoravelmente como relevante, embora normal – e, em nosso entender não apenas confirmam integralmente os pontos de vista da CDU como comportam revelações que de todo ignorávamos.

Assim:

- num aspecto relativamente secundário, verificámos que um problema que no anterior mandato os Vereadores comunistas repetidamente levantaram estava inteiramente claro: os Vereadores do PCP repetidamente interpelaram e fizeram requerimentos para esclarecer as condições e as razões por que, tendo sido assinada a escritura e mudada a propriedade do Parque Mayer, a Bragaparques continuou durante anos a explorá-lo enquanto parque de estacionamento, disso recebendo obviamente avultados lucros num terreno que já não era seu. Nunca nos foi dada qualquer resposta. Daquela troca de correspondência verifica-se que tal solicitação foi explicitamente feita pela empresa e que a ela expressamente a CML acedeu, facto de que nunca o anterior presidente, prof. Carmona Rodrigues, deu conhecimento à Câmara e que só cessou quando da recente transferência do Parque para a exploração da EMEL;

Por outro lado e bem mais importante:

- nada na escritura subsequente à permuta contraria as indicadas responsabilidades mútuas quanto às entregas dos terrenos permutados e respectivas responsabilidades económicas, financeiras e judiciais;

- uma esclarecedora correspondência trocada entre a CML e a Bragaparques confirma explicitamente os termos da escritura e aquelas condições e prevê mesmo a forma de lhes dar solução na situação criada pelas novas titularidades do terrenos dela decorrentes, mantendo integralmente as responsabilidades financeiras e indemnizatórias;

- não encontramos qualquer parecer jurídico fundamentado que contrarie o que decorre da escritura e daquela correspondência, mas uma informação, que terá sido solicitada já no mandato do PS, e que, em nosso entender, carece completamente de fundamento consistente. Considerar tal documento como explicando a assunção pela CML das indemnizações é a nosso ver inconcebível.

10. Sublinhamos que, já quando da abertura do concurso para definição dos termos de referência do plano de pormenor da zona do Parque Mayer aberta por este executivo manifestámos a nossa discordância pela incerteza do estatuto patrimonial do Parque em função da acção visando correctamente a anulação de todo o viciado processo da permuta.

Insistiu-se no processo do Plano de Pormenor do Parque (ambicioso, como se sabe), mas aí ainda se poderia dar o desconto de que se pretendia ganhar tempo para que as coisas estivessem concluídas do ponto de vista da planificação quando o imbróglio jurídico finalmente transitasse em julgado.

Igualmente se pode dizer que o início de obras no Capitólio (cuja manutenção e reabilitação na traça original) está prevista naquele plano no mesmo quadro de incerteza patrimonial se justificaria pela indispensabilidade de realizar obras de conservação, sob eventual risco de se tornar irreversível o estado de degradação do edifício.

O que já não parece de todo explicável e de nenhum ponto de vista é que a CML tenha dado o seu consentimento e eventualmente meios – simultaneamente com toda a questão da consumação das indemnizações – ao projecto da Associação de Turismo de Lisboa (que é presidida pelo presidente da Câmara e candidato do PS dr. António Costa!) a um «plano de animação» do devastado Parque Mayer a decorrer exactamente nos meses de Agosto, Setembro e primeira quinzena de Outubro (ou seja, pré-campanha e campanha eleitorais, rigorosamente!), com evidentes exigências e despesas de intervenções, arranjos, retoques, programações, etc.

Para além dos desenvolvimentos que se vierem a verificar, parece-nos assim inteiramente legítimo concluir com toda a linearidade duas coisas:

1º Em todo este processo, a única força política que defendeu intransigente e consequentemente os interesses da Câmara e da cidade de Lisboa e dos lisboetas foi a CDU;

2º A única força que se apresenta como uma efectiva alternativa, fundada e comprovada na realidade, à governação de Lisboa e à situação a que a cidade foi conduzida é a Coligação Democrática Unitária.


Lisboa, 30 de Julho de 2009